Nas florestas que se estendem por milhas, acompanhando os trilhos de
trem e passando por pequenos povoados, finalizando sua extensão,
finalmente, no Morro da Antena, habita uma lenda de pouco conhecimento
geral. Viveria, nessas terras pouco a pouco invadidas pela urbanização,
uma criatura humanoide de qualidade elusiva que guarda muitos paralelos
com a lenda norte-americana do Sasquatch. Com cerca de 2m de altura,
vigorosa constituição física e corpo coberto por espessos pelos, essa
espécie em muito reduzida vagaria pelas florestas se alimentando de
frutos, raízes e animais como veados, antas e outros de menor porte. Na
realidade, pouco pode ser deduzido do seu comportamento, mas há uma
série de pequenas especulações com base no ambiente em que vive.
Todavia, fazer a distinção entre criatura mítica e espécie desconhecida
seria um passo muito ousado, pois dispomos de pouquíssimos relatos de
pessoas que, caminhando, principalmente à noite, tiveram um
desagradável encontro com a criatura.
O Morro da Antena, no bairro São Pedro,
corresponderia ao limite norte de uma vasta região que compreenderia o
espaço natural entre BR-153 e a SC-135/350, contando com poucos
povoados e uma vasta disponibilidade de recursos naturais numa área de
quase 10.000km² (essa elevada numeração, no entanto, inclui terrenos
usados para agricultura). Caso se imagine uma espécie com relativa
inteligência e boa adaptação natural, não seria estranha a hipótese de
um comportamento já acostumado a evitar o contato com humanos após
milênios de convivência com povos indígenas. A probabilidade de que
exista, de fato, um ser de carne e osso que corresponda ao avistado por
poucas testemunhas aumenta se imaginada uma espécie em números já bem
reduzidos. No entanto, nada impossibilita a hipótese de relatos
distorcidos ou algum fenômeno paranormal.
Em comunidades como a de Nova Galícia ou mesmo em
Engenheiro Mello, há relatos de estranhos barulhos irrompendo o
silêncio da madrugada; vocalizações estranhas, gritos na mata,
estranhos rosnados e sons abafados de algo batendo com força em troncos
de árvore. De vez em quando, quando, por motivo ou outro, alguém se
coloca no caminho de uma incursão noturna para dentro da floresta, o
desafortunado acaba se encontrando com um ser que ele não consegue
identificar; alguma coisa diferente, inexplicável. Os encontros
relatados, apesar do medo angustiante que consome a alma dos pobres
viventes, são pacíficos. Por algum motivo, a criatura apresenta uma
natureza elusiva, preferindo evadir do local para seguir sua
peregrinação sem fim pelas matas densas e escuras. Alguns encontros
tiveram contornos de agressividade, mas não se sabe de nenhum caso que
tenha acabado em morte para que conste no texto. Porém, pensando-se em
todos os casos não solucionados de desaparecimento em matas da região,
não seria de surpreender que algum tivesse relação com esses momentos
em que o externo, o desconhecido, interpela o homem em sua efêmera
caminhada.
Um dos encontros com a criatura ocorreu no Morro da
Antena, no ano de 2012, quando A.R.M. estava com alguns amigos na
floresta fazendo fogueira e assando carne madrugada adentro. Naquela
época, havia uma porção do Morro da Antena que era acessível pelo
bairro São Pedro, próximo ao Bairro São Francisco. Anos mais tarde, a
região de acesso foi loteada e o perímetro que fazia contato com a
floresta foi murado. Naqueles tempos idos, o morro oferecia um refúgio
próximo e estimulante para jovens que desejavam fugir da contração
vital imposta pela vida urbana. Seguindo por aquele trecho introdutório
acessível pela rua, era possível subir todo o morro até a antena,
descer até os trilhos, acessar uma pequena cachoeira ou se perder nas
imensidões daquela vasta floresta de tantas possibilidades.
Na noite em questão, os amigos optaram por ficar
numa clareira próxima a uma pequena cachoeira (indicada no mapa) que
ficava após um barranco íngreme de uns 5 metros. Buscando mais lenha e
explorando as imediações, A.R.M. e um amigo foram em direção à
cachoeira, cujo barranco de acesso devia ficar a mais de 20 metros do
local da fogueira. Eram mais de 20 metros de distância dentro da mata,
deve se especificar. Quando os dois amigos chegaram às proximidades da
cachoeira, um peso gélido se instaurou no ar que os cercava. A.R.M.
estava um pouco mais na frente, vendo tudo com mais claridade que o
outro amigo. Lá embaixo, na cachoeira, viu uma sombreada forma
humanoide com elevada estatura, parada lá no meio daquele local de
custoso acesso na noite. O misterioso ser encarou A.R.M. por alguns
poucos segundos e então, numa manobra de difícil concepção, escalou
aquele barranco e, como que se transportando rapidamente de uma
localidade à outra, colocou-se a menos de 2 metros de A.R.M, que pôde
sentir a densa respiração daquela massiva forma escurecida. O ar era
pesado e a escuridão da noite parecia ter ficado duas vezes mais densa
com aquela estranha presença que parava ali a poucos metros de si.
Desesperado e sentindo sua circulação gelar diante daquela criatura bem
maior que ele (que tinha 1,74m), A.R.M. apenas virou e passou a correr
em desespero pelo mato até chegar ao local da fogueira, onde o restante
dos seus amigos se reunia. O rapaz que acompanhou A.R.M. viu a cena de
longe, com pouca claridade, mas também voltou apavorado depois do
vislumbre daquele enorme vulto negro que apareceu diante do seu amigo.
Ao chegar à fogueira, pálidos e ofegantes, contaram aos demais o que
haviam visto perto da cachoeira. A primeira reação de todos foi, é
claro, não acreditar na absurda história contada, mas logo, percebendo
o nível atípico de nervosismo no qual os dois amigos se encontravam,
deram um voto de confiança à narrativa. Os dois estavam completamente
pálidos, suando a frio e com as mãos trêmulas, em um estado de nervo de
nível muito mais elevado do que conseguiriam simular para uma simples
piada que não iria a lugar nenhum e seria contada de forma inalterada
por muitos anos ainda.
No
mapa, locais de avistamento conhecidos e as trilhas pela floresta
(incluindo a Trilha do Bugre, na parte norte do mapa e que encerra no
Bela Vista)
Há muitos anos, quando mata e urbe se misturavam no
início do morro da antena, os avistamentos eram mais frequentes. Em
meio às atuais ruas projetadas, Loteamento Olinger e outros, quando o
morro ainda era conhecido por muitos como Morro do Querosene, eram
comuns relatos de sons estranhos vindos do mato, sumiço de animais e
até o achado de estranhas pegadas que excediam o tamanho dos pés de
qualquer pessoa. Como um ser avistado sempre de longe, seus relatos
muitas vezes passavam adiante como vislumbre do lendário lobisomem,
pois ambas as criaturas lendárias têm uma forma humanoide e bípede.
Caso o encontro com esse sasquatch regional se desse em época de
quaresma então, aí era certo que o relato passaria adiante como um
encontro com o famoso lobisomem.
Pegada encontrada no Morro da Antena (no mapa, perto do desenho do
Sasquatch da direita). Não é grande como as demais relatadas, estando
aqui em comparação com um pé tamanho 43
As pegadas encontradas costumam ter cerca de 30 cm,
com algumas menores provavelmente pertencentes a criaturas mais jovens.
As diferenças para pegadas humanas são claras, o formato do pé difere
e, no meio da sola há uma espécie de relevo diferenciado na marca
deixada no solo. Isso se dá porque a espécie, como seu primo
norte-americano e muitos primatas, teria o pé de forma que a parte
metatarsal servisse como impulso para o caminhar, ao contrário do
humano, onde não é essa a parte que marca mais o solo. Essa curiosa
diferença afastaria clamores de falsificação, dada a improbabilidade de
falsificadores amadores interioranos conhecerem tais especificidades da
marcha primata ou de sua morfologia.
Na
esquerda, o modo de pisar humano e, à direita, o modo de pisar
característico de grandes primatas, que seria o mesmo do Sasquatch
Contudo, faltam evidências. Não se sabe, ainda, de
alguma fotografia clara da criatura em si. Comenta-se que um senhor, já
nos seus 80 anos, morador do interior de São Miguel da Serra,
fotografou a criatura nos anos 70, mas ninguém conseguiu localizar a
alegada fotografia até então. Ainda há esperança de que, apesar de
todos os males nela inclusos, a urbanização crescente acabe fazendo com
que essa reduzida população de criaturas tenha mais chances de ser
avistada e, assim, capturada pelas lentes de algum curioso. Como seu
suposto habitat se estende por muitos e muitos quilômetros, resulta por
abarcar alguns locais turísticos, como a cachoeira do km13 e os túneis.
Essa característica aumentaria as chances de encontro, uma vez que
muitas pessoas gostam de pernoitar nesses locais, buscando algum
sentido de aventura deixado para trás pelo homem moderno. Porém, é
justo aclarar que essas criaturas, ao que tudo indica, evitam ao máximo
o contato com humanos. É certo que, numa região vigorosa como a da
cachoeira do km13, prefiram os terrenos afastados da estrada, como a
floresta e os riachos que existem para baixo da cachoeira, aonde poucas
pessoas vão. Naquela região, eles têm acesso a um grande número de
animais e água corrente. Para cima do rio que chega à Cachoeira da Boca
do Corte, subindo uma trilha e ficando acima da queda maior, é possível
acompanhar o rio mata adentro até regiões bastante preservadas. O local
também seria uma boa opção para que a criatura não tivesse contato com
humanos nessas regiões com maior fluxo de pessoas.
Além dos pontos turísticos que existem nesse Círculo
do Sasquatch, há um grande número de povoados e de estradas rurais que
ligam as comunidades. São locais há muito já estabelecidos e que não
criariam desafio algum para uma criatura que já identificou muito bem
onde fica cada ponto desses, tendo ideia de quando é mais seguro
cruzá-los caso necessário. Mesmo os demais animais têm consciência de
que é melhor agir de semelhante forma a fim de preservar sua
existência. Quem anda pelas florestas sabe quão difícil é encontrar um
veado, uma anta ou outros animais de porte avantajado. Alguns animais
não dispõem de tanto cuidado, isso bem se sabe, mas o caso que tratamos
é bem diferente. Falando de uma suposta espécie inteligente e muito bem
adaptada ao ambiente, com séculos ou milênios de vivência ininterrupta
em matas de mesma característica, é razoável que se considere quão
elusiva ela pode se tornar.
Há, ainda, outros curiosos relatos envolvendo
avistamentos e interações com a misteriosa criatura. Um deles trata de
um encontro perto dos túneis antigos. É um passeio comum para os
habitantes da região o de caminhar pelos trilhos desativados de trem e
visitar os túneis da época em que a ferrovia era pujante. Normalmente,
as famílias fazem esse percurso rodeado pela natureza em tardes de
verão, aproveitando para tirar fotos da mata e reviver um pouco da
história local. Porém, há pessoas que, por motivo ou outro, fazem esse
percurso pela noite, o que é mais raro, pois o caminho carece de
iluminação artificial e é bastante ermo. Numa dessas ocasiões, um grupo
de amigos, carregando um garrafão de vinho e algumas carnes para assar
em fogueira, passaram pelo segundo túnel (no sentido Porto União -
Km13) após a meia-noite. Diferente do primeiro túnel, onde, desde a
entrada já se avista a saída, o segundo túnel faz uma leve curva,
fazendo com que, até certa parte, não se veja seu fim, mergulhando as
vistas em completa escuridão. Passar por aquele trecho é uma
experiência que inflige medo a muitos. Naquela noite, o grupo de
amigos, que já era familiarizado com aquelas partes, sentiu algo
diferente em comparação às tantas outras vezes em que se aventuraram
por aquelas bandas.
Para quem não é habituado à contemplação do silêncio, todos os
silêncios são o mesmo. Todavia, os mais experientes sabem diferenciar
diversos graus e intensidades dentro da ausência de som, e isso foi
especialmente claro naquela noite. Enquanto cruzavam o túnel, imersos
no breu total, os amigos sentiram que havia um corpo estranho na parte
lateral do túnel, não sabiam bem onde, mas a sensação de que havia algo
a mais ali era gritante. Junto à sensação, um odor que lembrava um
pouco o de "cão molhado", mas de forma mais intensa, mais presente e
envolvente. O grupo sentia uma pressão no ar, o que
lembra bastante o relatado por A.R.M. anteriormente. É como se o ar
adquirisse uma qualidade opressora, como se o medo fosse imposto
opressivamente de fora mesmo que não se visse a criatura. Alguns
defendem que esses seres possuem, assim como alguns animais, a
possibilidade de emitir infrassom, gerando medo irracional nas suas
presas. Medo irracional foi bem o que sentiram, experimentando
paralisante temor enquanto aquela presença não identificada parecia se
expandir por toda a escuridão do túnel. Num gesto brusco, um dos
amigos, como se estivesse quebrando um vitral com os braços descobertos
para sair daquele estado de terror, pegou a lanterna do bolso da sua
jaqueta e iluminou a parte do túnel à frente deles, mas não viu nada.
Em seguida, voltou a lanterna para a parte do túnel que já haviam
passado e lá estava, a cerca de seis metros deles, no trecho de túnel
que já havia sido vencido, uma figura enorme, com mais de 2 metros,
coberta em pelos, encarando o grupo de amigos enquanto respirava
profundamente e seu corpo insuflava vigorosamente. Aquela constituição
certamente permitiria a ele partir os ossos de um homem como quem parte
um graveto. Em desespero, todos correram até o fim do túnel e ainda
mais para frente, até o limite que antecedia um possível desmaio por
pressão e esforço intensivo. Não viram ou sentiram a criatura os
seguindo, mas, no momento da fuga, tiveram em sua direção algumas
pedras atiradas desde o interior do túnel, como que numa tentativa
moderada de afugentá-los.
O comportamento de atirar pedras ou pedaços de
madeira é bastante relatado. Apesar da aparente agressividade, não
parece uma atitude destinada ao abatimento do alvo, pois isso seria
alcançado facilmente por essa criatura de privilegiado porte, mas sim
ao afugentamento de sujeitos indesejáveis, como os humanos. Muitos que
caminham pelos trilhos, sobretudo à noite, falam sobre como pedras voam
na sua direção, cortando o ar sereno da noite, vindo de locais onde não
parece haver nada. Como no caso relatado, essas ocasiões dão margem
para muitas interpretações sobre o comportamento da alegada criatura.
Sequência de fotos recebidas que, supostamente, capturam uma dessas criaturas
São vários relatos semelhantes, sempre tratando de um ser desconhecido
que viveria nessas florestas. Uma criatura desconhecida ainda, um ser
que prefere viver dentro dos próprios silêncios, como parte integral de
uma floresta escura, fechada e úmida. Ademais, apesar da sua natureza
isolada, é possível que, em algum momento, quando o homem avançar ainda
mais sobre seus domínios, acabe tendo encontros muito mais infelizes
que os transcritos aqui.
De forma ou outra, o que foi registrado nesse artigo
permanece como uma incursão a domínios reais, palpáveis e próximos de
nós, onde habita algo de misterioso e temeroso. Há a possibilidade de
que os relatos sejam falsos, que as supostas evidências sejam
fabricadas ou que esse ser sequer seja uma presença física. Os
fenômenos do Skinwalker Ranch mostram que nem sempre os avistamentos
têm um respaldo nas espécies desconhecidas ou em anomalias zoológicas;
os acontecimentos podem ter um fundamento muito mais nebuloso e
traiçoeiro ao pensamento racional. Seja como for, as possibilidades
para o nosso caso regional ficam em aberto. A nós, meros caminhantes à
beira desse abismo escuro no qual se deposita todo o desconhecido,
resta apenas olhar com pavor para a sua negrura, com as pernas
trêmulas, sabendo que qualquer queda não oferecerá retorno.
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